DÍAZ-CANEL: COMO DEVEM SER OS QUADROS DA REVOLUÇÃO?
Discurso do Presidente de Cuba, Miguel Díaz-Canel, na comissão que tratou da política de quadros no 8º Congresso do Partido Comunista Cubano, ocorrido em 2021¹
Mas para mim está claro, primeiro preparação profunda, ideológica, revolucionária, ética e profissional, isso é o primeiro que tem que ter um quadro na revolução. Por isso que eu digo, nas condições da revolução, todos os quadros são quadros políticos. É uma coisa que estamos insistindo na estrutura do governo, os quadros de governo tem que se sentir quadros políticos, são quadros da revolução.

Não podem [apenas] ter um enfoque econômico dos problemas, têm que antes de tudo ter um enfoque ideológico, um enfoque político e um enfoque social. E eu diria mais, um enfoque ecológico, porque estamos falando de desenvolvimento sustentável. E esta é a visão da nação.
Nós também temos que ser coerentes com tudo que nós estamos propondo no que temos desenvolvido como conceito de modelo econômico e social, e às vezes essas coisas estão claras, mas não temos elas de forma completa. E isso passa também por uma cultura que precisamos criar, que precisamos desenvolver, por isso a importância da preparação e formação dos quadros.
Capacidade para a direção: saber atuar em situações complexas sem esperar ordens de cima
Os quadros têm que ter capacidade para dirigir sem esperar indicações. Os quadros têm que pensar por si mesmos, têm que ser capazes de analisar os contextos, para que quando estiverem diante de problemas complexos possam estabelecer alternativas. Se a estrutura em que estão não aprovam suas propostas, [mesmo assim] devem ter essa capacidade, porque com esse pensamento fazem com que as instituições superiores proponham outras saídas².
Não podemos confundir o quadro com a pessoa que está sempre esperando que alguém lhe diga o que fazer. Esse não é nem líder, nem quadro, é um tarefeiro, um cumpre tarefas, um empregado.
Aquele que está numa colocação de quadro apenas como um meio de vida, sem querer ofender a ninguém, não está se portando como quadro, não está conduzindo, aquele que está esperando que alguém lhe diga o que fazer para só depois tomar uma ação é muito diferente daquele que quando se vê diante de um problema, pelo compromisso que tem com a revolução, trata de buscar como superar o problema, como agir, como convocar, como planejar, como dirigir, como acionar. Essa capacidade também tem que ser desenvolvida, uma pessoa que não tem essa característica não dirige.
Contato com as bases: sensibilidade com os problemas das pessoas e preocupação com os problemas do país e da revolução
Temos que ter inquietude revolucionária como qualidade, chamo de inquietude revolucionária quando nos preocupamos com os problemas da revolução, com os problemas do país. Se estamos falando de economia e vejo uma lâmpada acesa em qualquer lugar gastando energia, você vai lá e apaga, ou que peça ou oriente alguém para que apague. Esse é o elemento mais trivial, mas que me preocupe que as pessoas tenham problemas de desabastecimento, os problemas das pessoas precisam me preocupar, mesmo que as vezes eu não tenha a solução, mas para que, pelo menos, eu possa argumentar e possa dirigir o trabalho político, explicar porque estamos nessa situação.
Outra qualidade que os quadros têm que ter é a sensibilidade pelos problemas das pessoas. (…) O quadro que tem sensibilidade com os problemas das pessoas vai ir às bases constantemente, porque vai buscar os problemas e as respostas na base. Aquele que não tem essa sensibilidade, se esconde no espaço da direção e acha muito ruim quando alguém se coloca contrário ao que ele pensa, esse quadro vai frear as soluções para os problemas – e a história das revoluções é cheia desses exemplos. Por outro lado, quanto mais discutimos, quanto mais debatemos, melhores são as soluções. Vejam quantas contribuições foram feitas hoje como parte deste debate, quantas coisas interessantes foram trazidas nesse ponto.
Senso de coletividade e saber atuar em situações adversas com firmeza e tenacidade
Os quadros têm que ter modéstia e tem que ser humildes! Essa é outra qualidade, qualidade que nosso povo aprecia muito. Outra maneira de dizer isto é que os quadros têm que ter a capacidade de sobrepor o NÓS acima do EU. O importante é a coletividade, não o EU apenas, NÓS!
O quadro, em nossas condições, tem que ter tenacidade e firmeza. Diante do inimigo é preciso se manter firme. E diante da complexidade é preciso ter tenacidade, para que mesmo diante de muitas adversidades estejamos constantemente dizendo: como vamos para cima?! Como faremos melhor?! Como superamos isso?!
Por isso eu falava – acho que comentei ontem – temos que ter capacidade para atuar em condições adversas e, como parte da preparação, temos que também colocar os quadros que tenham que desenvolver seu trabalho em condições adversas, com tempo prolongado.
Disposição para escutar e não ter constrangimento de pedir conselhos
Uma das características fundamentais que oferece um quadro é a disposição para escutar, para debater, debater de verdade! Porque tem muitos que falam sobre debates mas querem que ouçam tudo que ele diz, mas quando outro vai falar, eles cortam a comunicação.
Quando nós chamamos as pessoas para discutir um tema, um problema, não podemos ficar irritados ou incomodados se elas trazem seu ponto de vista diverso. Afinal, para que chamamos as pessoas para debater? Para que digam exatamente o que queremos ouvir? Ou para realmente enriquecer a discussão, construir consensos e analisar a fundo a situação? Para isso é preciso ter capacidade de escutar!
Capacidade para debater, capacidade e disposição para solicitar conselhos, sem constrangimentos. Se eu não sei de algo eu pergunto a quem sabe mais, sem nenhum tipo de constrangimento, eu preciso disso para solucionar o problema, para cumprir bem minha função como quadro.
Por isso que nós insistimos tanto na questão do conhecimento especializado. Vejam, se não tivéssemos ido pelo caminho do conhecimento na luta contra a Covid, não teria bastado apenas a força do nosso sistema de saúde, nem apenas a consciência do povo, nem apenas a gestão do governo. Foi preciso somar tudo isso à ciência.
A robustez de nossos protocolos, os cinco candidatos à vacina, a aplicação de mais de 13 biofármacos cubanos, as mais de 800 investigações que fizemos é o que deu a verdadeira força. Ou seja, isso tudo combinado, mas o que realmente fez a diferença foi o conhecimento especializado. Vocês sabem que toda semana um grupo de especialistas em diferentes temas eram ouvidos pelo governo e faziam propostas do que fazer para enfrentar a Covid?
Saber trabalhar em equipe e sempre melhorar sua formação
Os quadros têm que saber trabalhar coletivamente, em equipe, porque aqui ninguém tem a verdade absoluta. Com essa complexidade de problemas, temos que trabalhar em conjunto. Temos que aproveitar o conhecimento de cada um, o que cada um tem para contribuir.
Várias companheiras e companheiros, aqui definiram dois elementos muito importantes na discussão. A gente até pode programar cursos pode fazer todas essas coisas, mas o quadro precisa ter uma paixão, uma disposição por se auto preparar constantemente. E há muita informação que cada um deve gerir por si para preparar-se. E o outro conceito que combina com esse que se complementa é que o trabalho dos quadros é um processo de aprendizagem constante, nós nunca terminamos de aprender. Sempre estamos aprendendo e sempre temos que ter disposição para aprender. Um conhecimento que foi aplicado bem em um momento se torna obsoleto em outro, ou tem que ser aplicado de outra forma, ou a situação exige outro tipo de conhecimento.
Responsabilidade de formar novos quadros
E para finalizar, o último elemento que queria trazer como parte das qualidades, dos elementos que todo quadro deve ter. Todos os quadros têm que se responsabilizar por serem formadores de quadros. Somos quadros, mas também somos formadores de quadros.
Uma das coisas que mais deixa a desejar no desempenho de um quadro é quando te diz que não tem substitutos. Por que você não tem substitutos? Porque você se acha imprescindível, se você acredita que é imprescindível, está equivocado, mais do que isso, está negando a você mesmo, porque temos que aspirar que haja companheiros que sejam melhores do que nós, que nos superem, que superem o coletivo que estamos em um momento determinado. Se o foco não é o outro, se não tem substitutos porque não os preparou, você não cumpriu bem o seu papel como quadro, porque essa é uma das principais responsabilidades de todo quadro.
Os quadros que não entendem isso, não vão aplicar essa estratégia, não vão se desenvolver e com isso vamos seguir estagnados. E os que entendem buscarão todos as bases e métodos possíveis e aplicarão um estilo que lhes permitam avançar nessa estratégia e avançaremos com mais tropeços ou com menos tropeços, mas avançaremos e, se avançamos, estamos nos aperfeiçoando e estamos contribuindo com o processo, e se fazemos o contrário nos estamos deixando derrotar pelo problema.
1 – Nota da tradução: Este texto é tradução de parte da intervenção de Miguel Díaz-Canel na comissão número 3, do 8º Congresso do Partido Comunista Cubano (PCC), ocorrido em abril de 2021, que tratou da política de quadros. O discurso foi adaptado buscando manter o sentido original mas com adaptações tanto pela mudança de versão do espanhol ao português, como algumas adaptações da língua falada para a escrita, mesmo que isso ocorra em toda tradução, um leitor atento pode perceber uma variação do tom original, considerando a proximidade das línguas e a tentativa de se manter a estrutura original do discurso, feito em parte de improviso pelo líder socialista. A intervenção foi disponibilizada no canal do PCC no Youtube e pode ser conferida aqui: https://youtu.be/61bXxSnozZ0?si=ItXhnvlA7RIMsE19.
2 – Essa frase foi um pouco complexa de traduzir, mas acredito que o sentido foi mantido. Conferir com o original em: intervenção foi disponibilizada no canal do PCC no Youtube e pode ser conferida aqui: https://youtu.be/61bXxSnozZ0?si=ItXhnvlA7RIMsE19.
Miguel Días-Canel | Tradução: Rodrigo Choinski
