Menu fechado

O OLHAR HUMANO NA FOTOGRAFIA DE SEBASTIÃO SALGADO.

Sebastião Salgado (1944–2025) pode ser considerado o maior fotógrafo brasileiro de todos os tempos — talvez, um dos maiores da história — ao lado de outros grandes mestres, como Cartier-Bresson, Vivian Maier e Robert Capa. Seu trabalho pode ser definido tanto por sua consistência estética, presente desde seus primeiros projetos publicados (“Outras Américas”, de 1986; “Kuwait – Um deserto em chamas”, de 1991; e “Trabalhadores”, de 1993), quanto por sua profunda preocupação com todas as questões que nos tornam humanos: as condições de vida dos trabalhadores na América do Sul, o êxodo de populações em regiões de conflito, as guerras, a relação dos povos originários com a natureza e o impacto humano sobre ela.


Salgado, economista de formação, descobriu-se fotógrafo em 1973, em Paris — onde vivia exilado da ditadura militar por ter apoiado a ALN. Na época, ainda trabalhava para a Organização Internacional do Café, quando, ao pegar emprestada a câmera de sua esposa, Lélia, deu início a uma trajetória artística que se entrelaçaria para sempre à dela. Assim começou uma parceria entre fotógrafo e curadora que seguiria, de forma quase indissociável, ao longo de toda a sua vida. Passou por diversas agências como a Sygma e Gamma, até o momento em que entrou para a cooperativa Magnum, a mais prestigiada agência de fotografia do mundo. É durante seu período na Magnum que realiza seus primeiros projetos de fotografia documental e se torna um dos maiores destaques de sua geração.

Na década de 1990, após a publicação de um de seus trabalhos mais célebres (Exodus), foi acusado de “explorar a estética da pobreza”. Críticos diziam que sua fotografia buscava beleza na miséria. A resposta de Salgado não poderia ter sido mais firme:


“A luz aqui é a mesma luz que lá. A dignidade aqui é a mesma. A falha que meus críticos têm, eu não tenho. É o sentimento de culpa… Eu vim do Terceiro Mundo… As fotos que tirei, tirei do meu lado, do meu mundo, de onde venho.”


Essa preocupação em registrar seu povo, suas histórias e sua realidade seguiriam Salgado pelo restante de sua vida.


Seu último grande trabalho (Amazônia, 2021) foi fruto de anos de pesquisa. Salgado retratou a natureza exuberante da floresta, mas não apenas isso, documentou o cotidiano dos povos originários Yanomami, Asháninka, Yawanawá, Suruwá, Zoé, Kuikuro, Waurá, Kamayurá, Korubo, Marubo, Awá e Macuxi — sendo um dos mais belos registros etnográficos dos povos originários do Brasil.


Com a morte de Sebastião Salgado aos 81 anos no último dia 23 de maio, o povo brasileiro não perde apenas seu maior fotógrafo, mas também um cidadão preocupado com as questões sociais, ambientais e com a preservação da cultura e memória de seu povo. O legado deixado por Sebastião Salgado é o de uma lembrança constante: jamais devemos esquecer ou voltar nossos olhos para outras questões enquanto no mundo ainda persistirem a desigualdade, a violência e a crueldade entre nós. Que a terra que tanto amou lhe seja leve.