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TARCÍSIO SE REVELA.

Artigo de opinião por Igor Grabois

Tarcísio foi ministro da ‘infraestrutura’ no desgoverno Bolsonaro. Diziam que era um ‘case’ de sucesso, melhor ministro do desgoverno etc. Não construiu um mísero quilômetro de estrada ou ferrovia, não acresentou nenhum átimo de capacidade portuária ou aeroportuária. Mas privatizou muito. Terminou de liquidar a Infraero. Concedeu estradas com contratos generosos para os concessionários. Vendeu o Porto de Vitória, em uma das privatizações mais escandalosas da história.

Feito governador de São Paulo única e exclusivamente por sua associação a Bolsonaro, o ex major faz o mesmo no Palácio Bandeirantes. Vende tudo que o estado de São Paulo possui. E os escândalos de corrupção se sucedem.

A venda da Sabesp e a crise hídrica anunciada

A venda da Sabesp é um caso de polícia. Foi vendida em bolsa, com um generoso desconto de 30% sobre a cotação de mercado. Sem licitação, sem prêmio de controle, desrepeitando a legislação das estatais e das sociedades anônimas.

De cara, a empresa privatizada majorou as contas em até 200%. Ao ouvir as reclamações, o governador respondeu que “agora a Sabesp é uma empresa privada”.

Arrematada pelos mesmos controladores das Lojas Americanas, os novos donos se apressam em demitir gente, cortar custos de manutenção, terceirizar e quarterizar tudo. Da mesma maneira que Lehman e seu grupo estão fazendo na Eletrobras, vendida pelo Paulo Guedes. Estranho que Paulo Guedes é presidente de um tal conselho que supervisiona as privatizações. Eletrobras e Sabesp caindo na mão do mesmo grupo não é mera coincidência.

Há fortes suspeitas de manipulação nos índices de universalização, previstas na legislação do saneamento. A segregação de medições corre solta. Os números aparecem subindo, sem que um metro cúbico a mais seja formecido. A mesma edificação passa a ter várias medições. Um edifício com 12 apartamentos deixa de ter uma única medição e passa a ter 12.

No primeiro incidente grave da gestão privatizada, a ruptura de uma adutora embaixo da Marginal Tietê, a Sabesp se recusou a fazer o procedimento correto de manutenção e lançou o equivalente a 1000 piscinas de esgoto no rio Tietê, destruindo 10 anos de esforços de despoluição. Além de tudo, a privatização é desastrosa do ponto de vista ambiental.

Agora São Paulo vive uma crise hídrica. O mesmo fenômeno de dez anos atrás, o reservatório Cantareira baixando, comprometendo o abastecimento. Nenhum investimento. Nenhum plano de contingência. Apenas o corte de água nas periferias. E aumento das contas, pelo efeito do ar nas tubulações depois do restabelecimento do abastecimento.

E a Arsesp, a agência regulatória estadual com diretores com mandato, como na esfera federal, assiste impassível,  pois o contrato da privatização prevê autofiscalização por parte da Sabesp.

Para onde vai esse trem

Na sanha vendedora, a Companha Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) é retalhada, assim como o metrô,  com as linhas entregues a vários CNPJ’s. Cada empresa que pega uma linha de metrô ou da CPTM ganha por passageiro. Mas essas empresas tem um único dono. Mais linhas separadas, mais dinheiro. As linhas 4 e 5 são de empresas diferentes, bem como as linhas 8 e 9 da antiga CPTM também. Mas o dono de todas as empresa é o mesmo, o grupo Motiva, a antiga CCR. O serviço da Motiva nas linhas 8 e 9 se chama Via Mobilidade, conhecida pelos usuários como Via Calamidade, tal o número de incidentes, como falhas de energia, interrupção de serviços e até incêndio nos trens. E ela recebe pelo serviço ruim por passageiro a cada baldeação, ganhando duas ou três vezes pelo mesmo passageiro.

A ferrovia Santos Jundiaí foi inaugurada em 1867. A ideia era ligar o interior ao litoral. O traçado da antiga São Paulo Railway é a base das linhas 7 e 10 da CPTM. Tanto que até o dia 28 de agosto existia o serviço 710, que permitia aos usuários ir de Jundiaí ao ABC paulista sem baldeações. Pois é. Tarcísio seccionou a ferrovia. Vindo da linha 7, os usuários devem descer na Barra Funda. Os da linha 10 também. Na mesma plataforma. Uma única escada rolante e uma única escada fixa. O caos se instalou. E o melhor sistema metroferroviário do Brasil se transformou em um inferno na terra.

O fim do serviço 710 ocorreu para que a TIC Trens viabilizasse a aquisição da concessão da linha 7 e do Trem Intercidades de Campinas. Os arrematantes não quiseram o traçado da antiga Santos Jundiaí. Só interessava a linha Intercidades, mas teve os que levar a linha 7 no pacote, pois compartilha com o mesmo traçado com o intercidades. Inclusive com terminal na Barra Funda. Por isso o fim do 710. Lembrando que a tal TIC trens peretence à familia Constantino,  dona da Gol.

Pra tentar minorar o desagrado com o fim do serviço 710, o governador anunciou a Barra Funda como “hub ferroviário”. Sem nenhuma obra adicional pronta. Um complexo sobrecarregado com mais uma linha do metrô, dois terminais de ônibus urbanos e uma rodoviária. As imagens que circulam na Internet mostram o resultado.

Corrupção na veia

Na mesma semana em que acaba o serviço 710 da CPTM,  dois escândalos de corrupção abalam o governo estadual. Os dois envolvem a secretaria de fazenda do Estado.

O dono Ultrafarma, Sidney Oliveira, foi preso pela Polícia Civil junto com outros empresários em um mega esquema de fraude em créditos de ICMS. A empresa da mãe de um dos fiscais da receita estadual envolvidos chegou a movimentar 1 bilhão (!) de reais. Tudo isso nas barbas do secretário de fazenda…

Tarcísio levou uma semana para se pronunciar,  anunciando medidas para digitalizar o processo de declaração dos créditos, medidas essas que a secretaria de fazenda se recusou sistematicamente  a tomar. Falou em mão pesada do estado sobre os funcionários pegos no esquema, mas silenciou sobre os empresários corruptores.

Na sequência, a Polícia Federal revelou um esquema de fraude fiscal, lavagem de dinheiro e adulteração de combustíveis, com a participação de fintechs e fundos financeiros da avenida Faria Lima em São Paulo. Parte fundamental no escândalo foi a omissão da secretaria fazenda estadual em realizar a fiscalização tributária nos postos e distribuidoras de combustíveis. A ausência de fiscalização foi denunciada por servidores da Receita Estadual.

Soma-se à omissão fiscalizatória, a prisão na mesma operação do capitão Cagerana, da Polícia Militar de São Paulo. Cagerana era a ligação entre diversos fundos e os fraudadores de combustíveis. Seria mais um caso de corrupção policial se o referido capitão não fosse ex-integrante da segurança pessoal de Tarcísio, acompanhando o governador em 26 viagens oficiais…

Os dois escândalos têm, ao menos, a omissão da secretaria de fazenda. O envolvimento do governador é algo ainda a ser investigado.

Para completar, há doadores de campanha de Tarcísio envolvidos nas fraude de combustíveis, ligados aos fundos do PCC e grileiros de terras, alguns também envolvidos com o crime organizado. Para beneficiar a grilagem, Tarcísio fez aprovar uma lei de anti-reforma agrária, vendendo as terra aos grileiros com até 90 % de descontos. Muitos dos grileiros foram identificados na Operação Carbono.

Fascismo, moralismo e os grandes negócios

As privatizações de Tarcísio são justificadas apenas porque é preciso privatizar. Não há estudos de impacto nas finanças do estado e nos serviços aos usuários. Grupos que se beneficiaram no governo Bolsonaro e na gestão Paulo Guedes e empalmaram empresas estatais na bacia das almas também se locupletam com os ativos do Estado de São Paulo. Com o velho discurso moralista sobre os males da atuação estatal.

E esses mesmos grupos – banco BTG, Lehmann, o lumpen do asset da Faria Lima e os limpinhos e cheirosos do grande capital – elevam Tarcísio como grande gestor. Seria o fascista moderado, sem os arroubos de seu criador, mas que entregaria Petrobras e Banco do Brasil na liquidação. O que é o fascismo, senão a cobertura das grandes tacadas?

O bloco que apoia Tarcísio inclui a grande mídia, o agronegócio, o capital financeiro, policiais, militares – que vêem Tarcísio como um dos seus, mais até do que Bolsonaro – e o crime organizado. E a Operação Carbono mostrou que crime e capital andam paralelos.

A blindagem que a mídia e o secretário Kassab tentam dar ao governador já apresenta fissuras. As manhãs e fins-de-tarde infernais nos trens e metrôs na Região Metropolitana expõem a verdadeira face e os interesses que cercam o delfim do bolsonarismo.

Igor Grabois – Membro do Comitê Central da Liga Comunista Brasileira – LCB